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COMENTÁRIOS À MPV Nº 984/2020

COMENTÁRIOS À MEDIDA PROVISÓRIA Nº 984, DE 18 DE JUNHO DE 2020 

Altera a Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998, que institui normas gerais sobre desporto, e a Lei nº 10.671, de 15 de maio de 2003, que dispõe sobre o Estatuto de Defesa do Torcedor, e dá outras providências, em razão da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente da pandemia da covid-19, de que trata a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 62 da Constituição, adota a seguinte Medida Provisória, com força de lei:


Comentários:

1. O PREÂMBULO da MP nº 984/2020 já é digno de um comentário reflexivo. Consoante dispõe o artigo 62, da Constituição Federal, são exigidos dois requisitos para a elaboração do referido modelo normativo: RELEVÂNCIA E URGÊNCIA, como se atrai da sua transcrição a seguir:Art. 62. "Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional". (grifei).

2. É necessário buscar o real sentido que se dá à relevância e urgência dentro do contexto das Medidas Provisórias e, para tanto, vale a lição do Prof. Flavio Martins (Curso de Direito Constitucional, 4 ed., São Paulo : Saraiva Educação, 2020, p. 1.321), segundo o qual:"Relevância é sinônimo de importância. Assim, somente poderá ser editada uma medida provisória sobre assuntos considerados relevantes, de destaque. Por sua vez, urgência é a pressa, a necessidade de elaborar o ato normativo já, sem poder esperar os trâmites normais de um processo legislativo regular". (grifei). 

2.1. Observando o teor do art. 62, da CF e, os conceitos apresentados em relação à relevância e urgência, de antemão já se constata carecer de adequação e legalidade a Medida Provisória, eis que não atende aos requisitos constitucionais exigidos para a constituição do processo legislativo. 

2.2. A conclusão acima se dá com fundamento no fato de que não parece crível atribuir relevância e urgência com base no estado de pandemia, para tratar de questões contratuais quanto aos direitos de transmissão de espetáculo esportivo e, no que se refere ao art. 2º da MP em comento, se trata de medida plenamente sanável por meio da autonomia privada das entidades de administração e de prática desportiva (reconhecida e tanto mencionada no art. 217, da CF), que podem se valer dos regulamentos de suas competições para a introdução de tais adequações. 

2.3. Deve ser ressaltado que, contudo, por se tratar a relevância e a urgência de requisitos políticos e não jurídicos, a aferição do seu atendimento compete, via de regra, além do Presidente da República (quando da edição da MP), ao Poder Legislativo, sendo que o Poder Judiciário somente atrai para o seu escrutínio a apreciação desses requisitos, em caráter excepcional, quando constatado abuso de poder na edição da MP (ADI 2736/DF, Tribunal Pleno do STF, Rel. Min. Cezar Peluso, J. 08.09.2010) o que parece ter ocorrido no caso em comento.

2.4. Dessa forma, ressalvados entendimentos contrários, logo de início ao ser apreciado o atendimento dos requisitos exigidos para a edição de uma MP, relevância e urgência, pode ser concluído que a matéria objeto do ato normativo em comento não atende a tais requisitos, o que, em regra, deverá ser corrigido, a princípio, pelo Poder Legislativo.

Art. 1º.  A Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998, passa a vigorar com as seguintes alterações:

"Art. 42.  Pertence à entidade de prática desportiva mandante o direito de arena sobre o espetáculo desportivo, consistente na prerrogativa exclusiva de negociar, autorizar ou proibir a captação, a fixação, a emissão, a transmissão, a retransmissão ou a reprodução de imagens, por qualquer meio ou processo, do espetáculo desportivo.

§ 1º  Serão distribuídos, em partes iguais, aos atletas profissionais participantes do espetáculo de que trata o caput, cinco por cento da receita proveniente da exploração de direitos desportivos audiovisuais, como pagamento de natureza civil, exceto se houver disposição em contrário constante de convenção coletiva de trabalho.............................................................................................................

§ 4º  Na hipótese de eventos desportivos sem definição do mando de jogo, a captação, a fixação, a emissão, a transmissão, a retransmissão ou a reprodução de imagens, por qualquer meio ou processo, dependerá da anuência de ambas as entidades de prática desportiva participantes." (NR)

Comentários:

1. Superada a análise a respeito da legalidade formal da presente MP, independentemente do quanto nela concluído, passa-se a análise do conteúdo desta se efetivamente se aplicarem os seus efeitos e, ainda, se for convertida em lei futuramente.

2. Deve ser analisado se quanto à matéria estão atendidos os Princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, visando o cumprimento dos requisitos materiais atinentes ao processo legislativo, pelo que se transcreve a redação anterior do dispositivo legal alterado:

Art. 42.  "Pertence às entidades de prática desportiva o direito de arena, consistente na prerrogativa exclusiva de negociar, autorizar ou proibir a captação, a fixação, a emissão, a transmissão, a retransmissão ou a reprodução de imagens, por qualquer meio ou processo, de espetáculo desportivo de que participem".  (grifei)

§ 1º "Salvo convenção coletiva de trabalho em contrário, 5% (cinco por cento) da receita proveniente da exploração de direitos desportivos audiovisuais serão repassados aos sindicatos de atletas profissionais, e estes distribuirão, em partes iguais, aos atletas profissionais participantes do espetáculo, como parcela de natureza civil". (grifei). 

2.1. Comparando a redação anterior do art. 42 e seu § 1º, da Lei nº 9.615/1998, tem-se a modificação quanto à negociação do direito de arena decorrente da transmissão dos espetáculos esportivos, que era de ambos os clubes e, na redação da MP nº 984, passou a ser exclusivamente da entidade de prática desportiva que obtiver o mando  da partida. 

2.2. Antes de abordar se restou atendido o caráter material do processo legislativo, pede-se, vênia, para destacar que as mudanças necessárias para o futebol brasileiro (resolução do passivo da maioria das entidades de prática, aperfeiçoamento da estrutura de governança e de propriedade, visando atrair investidores de maior potencial e não somente patrocínios, eventual criação de uma Liga Nacional, etc),  devem ser tratadas com a participação da coletividade que integra o produto/sistema "futebol brasileiro", dentro do exercício da autonomia privada assegurada às organizações esportivas, nos termos do art. 217, da CF e, não, partindo de um ou de poucos integrantes desse sistema, muito menos com a participação e dependência do Poder Público, atitudes essas que impedem o avanço organizado e colocam o futebol do Brasil em desvantagem no cenário mundial de mercado, ainda que com todo o capital histórico e potencial de desenvolvimento. É NECESSÁRIO UNIDADE E ORGANIZAÇÃO AUTÔNOMA DOS CLUBES DE FUTEBOL DO BRASIL.

2.3. Voltando ao caráter jurídico, talvez o argumento que pode inviabilizar a modificação do art. 42, caput, da Lei nº 9.615/1998, seja a própria ausência de urgência e relevância da matéria (ainda que seja um requisito formal), aqui se confundindo com o critério material do processo legislativo por ser utilizada inadequadamente sem permitir um debate e a participação dos integrantes do sistema afetado pela alteração normativa. Entretanto, cabe aqueles que se sentirem prejudicados buscarem, ao menos nessa hipótese, mediante o seu capital político, pressionar o Congresso Nacional a não converter a MP em lei ou, em medida extrema e urgente, analisada a excepcionalidade anteriormente comentada, se socorrer de algum legitimado para que venha a ingressar com ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) perante o Supremo Tribunal Federal.

2.4. Quanto à aplicação imediata dos termos do caput, do art. 42, alterado por meio da MP 984, aos contratos vigentes anteriormente a esta, ao nosso sentir, deve ser plenamente refutada. Inicialmente diante da patente inconstitucionalidade formal da MP. Porém, ainda que superado tal argumento, invoca-se o teor do art. 6º, §§ 1º e 2º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, também assegurados constitucionalmente, que consistem no ato jurídico perfeito e no direito adquirido, ressalvadas as previsões contratuais em sentido contrário, já que se desconhece o teor dos contratos de cessão dos direitos de transmissão vigentes. 

2.5. Outro ponto relacionado ao art. 42, da Lei Pelé é a alteração do § 1º, com destaque para a exclusão do repasse ao Sindicato da categoria de atletas profissionais do percentual de 5% (cinco por cento) devido aos atletas que participam do evento esportivo. Em que pese, os vícios de formalidade e, possivelmente até de materialidade, da MP, a alteração trazida no citado dispositivo se demonstra até pertinente, uma vez que não faz sentido repassar quantia devida ao atleta profissional, ao Sindicato da categoria, pois a relação é direta entre o clube e a empresa cessionária dos direitos de transmissão, assegurado o direito do atleta, sendo desnecessário qualquer intermediário para tanto. Porém, a mudança deve vir por intermédio de projeto de lei, amplamente discutido no Congresso Nacional, como já destacado.

3. Por fim, quanto ao art. 1º, da MP ora comentada tem-se a inclusão do § 4º, que, pretendendo evitar omissão quanto à mudança apresentada no caput do art. 42, em uma eventual partida com mando de campo neutro (como tem ocorrido na Libertadores da América e tende a ocorrer em outras competições nacionais), prevê que caberá a ambas as equipes negociar e anuir a respeito dos direitos de transmissão de partidas dessa natureza.

Art. 2º.  Até 31 de dezembro de 2020, o período de vigência mínima do contrato de trabalho do atleta profissional, de que trata o caput do art. 30 da Lei nº 9.615, de 1998, será de trinta dias.

Comentários:

1.
Analisando o caráter material do art. 2º da MP 948, em que pese atender ao cenário criado por conta da pandemia mundial, principalmente visando o término das competições estaduais, novamente incide a ausência do caráter formal do processo legislativo, eis que tal matéria deveria ser tratada pelas entidades de prática e de administração desportivas, mediante simples alteração, ainda que excepcional, dos regulamentos de tais competições, se tornando desnecessário tal assunto ser tratado por meio de MP, pelo Presidente da República, figura de liderança principal do país e, que deve se ater a matérias muito mais importantes exigidas e necessárias nesse momento por esta Nação. Não é questão aqui de afastar o futebol/esporte da relevância e urgência, porém, as organizações dessa natureza já estão acobertadas pelo manto da autonomia privada insculpida no art. 217, da Carta Maior, como já mencionado.

2. Entretanto, o dispositivo acima pode ter o escopo de tornar ainda mais precário, um sistema já vulnerável (prazo mínimo de 3 meses), diante da falta de calendário e de organização das entidades de prática e de administração do desporto, quanto à manutenção das atividades e o produto futebol no Brasil. Porém, ainda que venha a se alegar o cenário atípico causado pela pandemia (suspensão de competições, dispensa de atletas e retorno de competições estaduais), deveria haver um debate envolvendo essas entidades (e tiveram tempo para isso) para vislumbrar a possibilidade de um calendário vigente até o final do ano (por óbvio estimando a data de efetiva possibilidade de retorno com segurança a todos os envolvidos) e, não, reduzir ainda mais o lapso contratual. A medida, se for adiante, o que não se acredita, tem o condão de tornar possível, na maioria de clubes a contratação de atletas para disputar apenas algumas partidas finais das competições estaduais. Novamente por inércia e por influência de quem não vive esse cenário, as organizações esportivas acabam por deixar que o Poder Público interfira, volto a repetir, por inércia, na esfera de matéria que deve ser tratada no âmbito privado, já assegurado constitucionalmente. 

Art. 3º.
  Ficam revogados os § 5º e §6º do art. 27-A da Lei nº 9.615, de 1998.

Comentários:

1. Aqui a MP em comento prevê a revogação dos §§ 5 e 6º, do art. 27-A, da Lei Pelé, que impede (acaso a MP não prospere e se mantenha o quanto vigia antes desta) que as empresas que detém os direitos de transmissão das competições, venham a patrocinar os uniformes das equipes que as integram. Novamente, pode haver violação material do processo legislativo, eis que a matéria carece de amplo debate entre os envolvidos, especialmente, pelo fato de poder haver conflitos de interesses aparentes em negociações como estas. Não se está afirmando a impossibilidade da citada alteração legislativa, contudo, é de suma importância que os envolvidos, individualmente ou por meio de entidades ou associações representativas integrem a discussão dessa mudança o que é inviável por meio de Medida Provisória, deixando clara também a inadequação formal do ato normativo. 

Art. 4º. Esta Medida Provisória entra em vigor na data de sua publicação.


Imagem obtida em: https://www.camara.leg.br/noticias/669802-medida-provisoria-da-direito-de-transmissao-de-jogos-para-clube-mandante
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